quinta-feira, 7 de novembro de 2013

O Deserto e a Bíblia [parte II]

   O deserto é um símbolo teológico para luta e privação. Para sofrimento e perda. Vulnerabilidade e desamparo. Deslocamento e confusão. Mas também é o local espiritual onde o renovo acontece e o homem, em meio à crise, descobre algo sobre Deus, que antes não conhecia.

   Quando Israel completou quarenta anos no deserto, Moisés guiou o povo a um planalto que, na atualidade, é o oste do Jordão. Podiam ver através do vale do Jordão a boa promessa da terra que Deus lhes concedera. Porém Ele não os levaria a possuí-la ainda. Ao invés disso, interpretou o significado da experiência no deserto que haviam acabado de completar. Deuteronômio é a recitação da lei uma vez dada no Sinai, agora reforçada e aplicada a outras áreas, antes de sua entrada na Terra Santa. Neste livro, nos capítulos 6-10, Moisés interpreta as funções da experiências no deserto e relembra Israel de muitas coisas: o comprometimento sagrado à aliança, feito do Sinai, sua promessa de permanecer puros e sem contaminar-se com a cultura cananita, o ideal de construir uma nação de justiça e bondade. E então pede-lhes que jamais esqueçam o significado do deserto:

    E te lembrarás de todo o caminho pelo qual o SENHOR, teu Deus, te guiou no deserto estes quarenta anos, para te humilhar, para te tentar, para saber o que estava no teu coração, se guardarias os seus mandamentos ou não. E te humilhou, e te deixou ter fome, e te sustentou com o maná, que tu não conheceste, nem teus pais o conheceram, para te dar a entender que o homem não viverá só de pão, mas que de tudo que sai da boca do SENHOR viverá o homem. Nunca se envelheceu a tua veste sobre ti, nem se inchou o teu pé nestes quarenta anos. Confessa, pois, no teu coração que, como um homem castiga a seu filho, assim te castiga o SENHOR, teu Deus (Dt 8. 2-5).

  As experiências no deserto também podem tornar-se oportunidades marcantes de renovo e fé, ou virar motivo de amargura e raiva. Resumindo, quando no deserto de nossa própria desolação, devemos escolher como reagir. Muitos israelitas jamais chegaram à Terra Santa, mas ao invés disso, morreram no deserto. A história do deserto é pontuada por homens e mulheres que demonstraram raiva e ressentimento por acharem que Moisés e seu Deus não estavam fazendo um bom trabalho ao conduzir as coisas.

   Outros estavam dispostos a permanecer em silêncio e aprender. Quando Jesus esteve no deserto por quarenta dias, Satanás tentou-o de diversas formas a driblar as dificuldades. Em cada caso, Jesus respondeu recitando trechos de Deuteronômio 6-10, o manual de Israel para a vida no deserto.

  O deserto, então, é uma oportunidade para ouvir coisas que jamais ouvimos, para descobrir o que repousa no centro de nossa alma. Isso não é divertido nem fácil. Mas estranhamente Deus se agrada em falar no deserto. Na esterilidade e austeridade, no silêncio provocado pela privação, Deus é ouvido. Isso foi precisamente o que aconteceu a Elias (I Reis 19). No deserto de seu desespero, quando finalmente senta-se ao pé de uma árvore e desiste, um anjo lhe fala e o alimenta. Após quarenta dias de mais viagem, esconde-se numa caverna no monte Sinai, e repentinamente ouve Deus: "Que fazes aqui, Elias?". E a partir deste momento, uma nova conversa se inicia.

   A Bíblia apresenta inúmeros casos de homens e mulheres fugindo para o deserto. É uma misericórdia severa, no entanto é misericórdia. A experiência no deserto é onde descobrimos algo a respeito de nós mesmos - e Deus vê o que é verdadeiro em nosso coração. É aqui que sua simples provisão de água, maná e cordonizes repentinamente é vista por sua beleza e maravilha. E é aqui que podemos escutar a voz de forma jamais ouvida.


Em Cristo,
André Gonçalves.



Bibliografia:
Burge, Gary M. - A Bíblia e a Terra - CPAD, pág. 46,47,48.

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